Durante uma cerimônia simbólica em Cruz das Almas (BA), estudantes da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia entregaram ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva um diploma informal de “doutor honoris causa”. A entrega, marcada por forte conotação política, acabou ganhando repercussão negativa pela quantidade de erros gramaticais no documento.
O caso gerou constrangimento entre acadêmicos e servidores da UFRB. Mesmo sendo um ato simbólico, a grafia inadequada e a construção incorreta de frases acabaram expondo a fragilidade da preparação linguística dos envolvidos e levantaram questionamentos sobre o rigor acadêmico em instituições públicas de ensino superior.
Erros gramaticais comprometem a credibilidade simbólica
Entre os deslizes encontrados no diploma entregue, dois chamaram a atenção de especialistas e do público: o uso da palavra “dicentes” no lugar do correto “discentes” e a vírgula separando o sujeito do predicado. Ainda que não se trate de um documento oficial, a entrega de um diploma, mesmo informal, deveria ter seguido padrões mínimos de correção.

A palavra “discentes”, usada em contextos acadêmicos para identificar os estudantes, tem origem no latim e é amplamente adotada em textos universitários formais. A forma “dicentes” não apenas é incorreta como evidencia uma falha de compreensão semântica. Já o uso indevido da vírgula — “A Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, concede…” — fere uma regra elementar de pontuação, ensinada ainda no ensino fundamental.
Decisão judicial anulou cerimônia oficial
A cerimônia oficial de concessão do título de doutor honoris causa ao presidente havia sido suspensa pela Justiça Federal antes da visita. A decisão foi tomada pelo juiz Evandro Reis, da 10ª Vara Federal Cível da Bahia, sob a alegação de irregularidades no processo de aprovação interna da UFRB. A universidade, por meio de nota pública, confirmou que o diploma entregue não possui valor institucional.
Mesmo cientes da decisão judicial, seis alunos resolveram entregar, por iniciativa própria, o documento simbólico durante o evento com a presença de Lula. A atitude confrontou a suspensão determinada pela Justiça e acabou envolvendo a universidade em uma polêmica desnecessária.
Especialistas apontam falhas básicas de revisão
Linguistas e professores universitários se manifestaram após a circulação da imagem do diploma nas redes sociais. Para o professor Pasquale Cipro Neto, referência nacional no ensino da língua portuguesa, erros como os presentes no documento evidenciam despreparo e falta de revisão mínima. O uso inadequado de termos técnicos e a estrutura frasal mal construída comprometem não apenas o conteúdo, mas a imagem de quem o assina.
Ainda que o texto tenha sido elaborado fora dos canais formais da universidade, a assinatura de estudantes da UFRB confere a ele uma espécie de chancela que pode levar o público a associar sua qualidade à instituição. Num cenário em que a educação pública enfrenta críticas e desafios, esse tipo de exposição fragiliza a autoridade acadêmica.
Diplomas simbólicos exigem rigor acadêmico
Mesmo que informal, um título simbólico, quando entregue em público a uma autoridade nacional, carrega uma carga simbólica importante. Não se trata apenas de um gesto afetivo ou político, mas de um ato que remete a uma prática institucional da academia: a concessão de honrarias. Espera-se, por isso, que a linguagem empregada siga padrões compatíveis com o ambiente universitário.
Estudos da área de linguística aplicada reforçam que documentos públicos ou semipúblicos, mesmo informais, devem respeitar normas gramaticais básicas para garantir clareza, coerência e respeito ao interlocutor. Nesse caso, o receptor do diploma era o próprio presidente da República, o que torna o cuidado com o texto ainda mais essencial.
UFRB tenta preservar imagem após repercussão
Diante da repercussão negativa, a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia apressou-se em esclarecer que a entrega do diploma partiu exclusivamente dos estudantes. A nota oficial reforçou que a instituição não tem qualquer vínculo com o conteúdo ou a forma do documento simbólico.
O episódio abriu espaço para uma discussão mais ampla sobre o preparo linguístico dos alunos do ensino superior. A polêmica evidenciou que o domínio da norma culta segue sendo uma exigência fundamental para quem representa ambientes acadêmicos, mesmo em situações informais. A informalidade, quando mal executada, transforma o simbólico em constrangimento público.