A “Operação Presságio” desdobrou-se como um dos maiores escândalos envolvendo verbas públicas em Florianópolis, atingindo diretamente a Secretaria Municipal de Cultura. Conduzida pelo Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado (GAECO), a ação trouxe à tona suspeitas de desvios milionários durante a gestão do ex-vereador Ed Pereira, que ocupou o cargo de secretário até o fim de 2023.
O caso chama atenção não só pela quantia envolvida, mas pela complexidade do esquema, que incluiu contratos com organizações da sociedade civil, favorecimento de empresas específicas e ausência de controle efetivo sobre a aplicação dos recursos. A operação põe em xeque a transparência da administração pública e levanta questões sobre a fiscalização e uso das leis de incentivo à cultura.

GAECO investiga desvio de R$ 6 milhões na Cultura de Florianópolis na gestão de Ed Pereira
Desvios na Secretaria de Cultura sob suspeita
Mais de R$ 6 milhões repassados a instituições culturais desapareceram sem comprovação de uso. Os valores, destinados a eventos, oficinas e ações comunitárias, sumiram em contratos com entidades que não tinham atuação comprovada.
Perícias apontaram que oficinas financiadas jamais foram realizadas. Endereços informados nos projetos sequer existiam ou estavam abandonados. O uso das verbas não foi documentado, o que levantou suspeitas imediatas sobre o modelo de gestão.
O Ministério Público reforçou que a liberação dos valores ocorreu mesmo diante da falta de prestação de contas. Projetos sem estrutura mínima foram aprovados em tempo recorde, sempre com aval da gestão comandada por Ed Pereira.
Entidades fantasmas e repasses sem controle
Relatórios técnicos mostraram que as organizações contratadas não possuíam histórico cultural nem sede própria. Em alguns casos, os CNPJs haviam sido criados semanas antes da assinatura dos convênios.
Fiscalizações in loco realizadas pelo GAECO constataram que os endereços informados estavam desativados. O quadro de funcionários das entidades era inexistente. Não havia público atendido, tampouco equipamentos básicos para execução das propostas.

O Tribunal de Contas identificou que muitas dessas entidades não entregaram relatórios exigidos por lei. Mesmo assim, receberam novas parcelas e tiveram os convênios renovados sem qualquer sanção administrativa.
Uso político dos recursos culturais
As investigações revelaram que boa parte das entidades favorecidas mantinha vínculos com o ex-secretário. Projetos aprovados se concentravam em bairros estratégicos do eleitorado de Ed Pereira.
Mensagens obtidas pelo GAECO mostraram o ex-secretário orientando aliados sobre como moldar propostas para facilitar o repasse. O conteúdo indicava interferência direta nos trâmites administrativos da pasta.
O uso da verba pública para fins eleitorais foi apontado como uma das linhas mais graves da investigação. A verba da cultura teria servido para angariar apoio político e consolidar lideranças comunitárias aliadas.
Ausência de fiscalização interna favoreceu fraudes
A estrutura de controle da Secretaria de Cultura estava desmontada. As comissões de análise técnica operavam sem critérios claros e sem atas registradas.
Faltavam auditorias internas, cronogramas de acompanhamento e qualquer sistema de checagem dos resultados dos projetos. Não houve exigência de contrapartida das entidades contratadas.
Segundo o TCE-SC, o modelo implantado durante a gestão de Ed Pereira permitiu que a verba pública circulasse sem controle. Nenhuma meta foi estabelecida. Os resultados dos projetos não eram medidos, nem avaliados.
Impacto no setor cultural local
Produtores e artistas independentes relataram sensação de injustiça. Projetos consistentes foram deixados de lado enquanto entidades sem atuação comprovada acumulavam recursos.
A credibilidade dos editais municipais foi comprometida. Muitos desistiram de inscrever propostas após perceberem que os critérios de avaliação eram desrespeitados.
O Conselho Municipal de Cultura chegou a emitir nota pedindo reformulação completa dos processos de seleção. Entre as sugestões, apareceu a criação de um núcleo técnico independente, livre de influência política.
Tecnologia e rastreamento como solução futura
Especialistas apontaram que o uso de ferramentas digitais poderia ter evitado os desvios. Plataformas públicas de rastreamento de recursos já são usadas em cidades como Recife e Belo Horizonte, com bons resultados.
Sistemas baseados em blockchain permitem verificar cada etapa da execução de projetos. Desde a aprovação até o pagamento final, todo o histórico fica disponível ao cidadão em tempo real.
A adoção de tecnologias desse tipo foi recomendada pelo GAECO como forma de reforçar a transparência. A Prefeitura, até o momento, não apresentou plano para implementação.
Cadeia de favorecimento amplia alcance da investigação
A operação não se restringe ao ex-secretário. Empresários e dirigentes de ONGs também estão sendo investigados por participação direta nos repasses.
Contratos superfaturados e transferências bancárias entre pessoas ligadas aos envolvidos foram detectadas. A quebra de sigilo mostrou depósitos fracionados, compras de veículos e imóveis em nome de terceiros.
Três empresas beneficiadas não apresentavam atividade econômica real. O GAECO acredita que foram criadas apenas para simular a execução dos projetos culturais.
- Mais de R$ 6 milhões desviados da Cultura de Florianópolis, segundo o MP
- Entidades fantasmas receberam recursos sem comprovação de atividades
- Ed Pereira teria usado verba pública com fins políticos, diz investigação
- Falta de fiscalização interna facilitou repasses irregulares por anos
- Artistas denunciaram favorecimento e abandono de projetos legítimos
- Especialistas recomendam uso de tecnologia para monitorar os contratos
- Empresas de fachada participaram da estrutura de desvio identificada